PRIMEIRA SESSÃO…

Confesso que demorei… relutei por muito tempo para chegar aqui, entrar neste casulo e me despir.
Sei que o relógio corre e tenho que saber relatar as coisas da minha alma com esses ponteiros correndo. E quando esgotam as voltas dos ponteiros tenho que me colocar em pé e sair de rompante. Fechar a porta e aguardar a próxima sessão.

Uma visita por semana, respeitando o horário – nem um segundo a mais ou a menos. Um contato distante e profissional para poder fluir uma análise imparcial e livre de julgamentos.

É um desconforto. São tantas angústias… tantos desalentos que nem sei por onde começar?

Não! Acho que não quero uma regressão! Não quero voltar… Quero seguir adiante. Voltar, sem poder mudar, nada adianta e, pensar que o que passou poderá ser usado para resolver o presente e ter um futuro mais estável, é o maior dos enganos.

Não! Regressão não!

Apenas me ouça em tudo o que eu tiver para falar, porque aqui eu consigo e lá fora não!

Já deixo bem claro que nunca fui boa com as palavras ditas, mas as palavras escritas, estas eu talvez desenhe com mais clareza.

Até tenho vontade de perguntar se as sessões poderiam ser escritas, rascunhadas, deliberadamente desenhadas em cada letra, assim me facilitaria muito e causaria menos desconforto e a precisão dos sentimentos, embora usando muitas metáforas e divagações abundantes, seria de mais valia.

Quantas sessões serão necessárias para que eu possa arrancar de mim todas as dores, para que meu caminho seja mais eficaz a mim mesma? Terei que ser escrava deste divã? E você nunca me dirá nada… apenas me ouvirá, assim, como quem ouve o vento, sabendo que ele sempre sopra, mas que nada tira do lugar?

Na verdade eu estou completamente solta… sem amarras. Desprendi-me de todas e eu sei que isto não é bom!

Estou confusa! Descobri coisas horríveis de mim diante da desesperança que me assola. Um desassossego que faria Fernando Pessoa perder de longe.

Meu avesso não tem cor! Se ao menos fosse escuro como o breu… se ao menos eu pudesse tocar meu avesso. Se ao menos eu pudesse gritar esse meu outro lado impalpável.

E já vai olhando para o relógio. Já me diz que o tempo esgotou e que me espera para a sessão…

Eu venho!
Venho porque preciso muito falar e falar e falar e falar por quantas vezes for necessário eu voltar aqui.

Este divã é confortável e me acolhe tão bem!!!
Ninguém entende o que eu não entendo e, não podia ser diferente!

Eu volto! Pode me aguardar na semana que vem, no mesmo horário… no mesmo dia da semana.

Tenha certeza que não desmarcarei a consulta.

Ando vazia de tudo e não tenho ninguém para falar!

Estou aqui na tentativa de não emudecer por inteiro… de não enlouquecer o que já está tão insano.

Eu volto! Quem sabe mais organizada e pronta para contar algumas coisas tão secretas e ordinárias… tão sedentas de resoluções.

Eu volto! Eu volto! Eu volta, sem fazer voltas.

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