Muitas vezes é preciso silenciar-se.
Os dias andam muito ruidosos.
Tenho observado uma necessidade das coisas acontecerem todas juntas e misturadas.
As pessoas não dormem mais.
Há uma cobrança muito grande para que elas estejam constantemente plugadas em todos os acontecimentos.
A medida de horas de um dia já não é mais suficiente.
Quanto mais se tem mais se precisa e mais se quer.
Ainda, semana passada, uma amiga me disse que seu dia precisaria ter 72 horas, porque seus afazeres são tantos que já não bastam as frações das 24 horas divididas equilibradamente para todas as atividades.
Certos hábitos foram extintos do cotidiano.
Ninguém se ouve mais e nem ouve aqueles que estão ao seu redor. Não há mais contemplação.
Tudo esta sob o controle das mãos e dos olhos em torno de uma tela.
Ninguém toca mais ninguém.
Tudo é feito virtualmente.
Acabaram as filas, onde tínhamos a oportunidade de travar diálogos corriqueiros e leves como a alta da gasolina, os preços do supermercado, falar da falta de chuva ou do excesso dela.
Uma parede altamente informativa levantou-se entre os seres humanos.
Não há mais colegas de trabalho, pois hoje todos estão office home.
As reuniões são virtuais, os documentos são virtuais, o banco, o mercado, as lojas, a escola dos filhos, a missa, o culto, os eventos e as altas discussões em família também, pois hoje tem grupo para tudo – grupo do médido, do dentista, dos amigos, das notícias, dos vizinhos, da vendedora da Natura, do Boticário, da Avon, dos pais, dos avós, dos serviços públicos…
Sem querer ou, por imposição da realidade, me afundei, assim, devagar e despercebidamente, nessse novo tempo… nesse novo mundo onde os amigos que eu encontrava e sentia a energia corpórea deles, o aroma dos seus perfumes, o brilhos dos olhos e o calor dos abraços também se encontram nessa nova era.
O tempo realmente virou uma medida rara e insuficiente para muitos.
Eu sou poeta.
Preciso de vazios para preencher com palavras que me toquem.
Escrevo para curar minhas feridas.
É preciso desacelarar.
Decidi botar meus pés no freio e realinhar com os sentidos mais autênticos da vida.
Recolher-se é necessário e saudável.
Sintonizar-se com os sons da própria alma, devagar, aos poucos…
Sair do engodo dos vazios que se escondem dentro das pressas, das urgências e emergências.
Quero passar mais tempo, rolando na cama, mastigando as manhãs sob os lençóis, esperar aquela carta que era entregue pelos correios, desenhar sonhos que não precisam ser realizados, mas sorvidos pelo coração em tessituras coloridas e delicadas como uma aquarela quase imperceptível.
Bem devagar, viver, ainda que eu fique de fora de tudo aquilo que os outros estão por dentro.
Ser feliz é saber movimentar-se com parcimônia, conseguindo compreender cada detalhe mais simples e invisível aos olhos.
Por fim, descobrir-me inteira, intensa e vívida na plenitude que a vida nos pede e, eu, merceço viver, plenamente.