O HOMEM QUE ESQUECIA – Marcus Madeira

Joaquim acordou com a sensação de que algo estava errado. Procurou a chave da casa: nada. Vasculhou os bolsos, o criado-mudo, a mesa da cozinha. Esqueceu onde havia deixado o telefone. Às vezes nem lembrava que tinha telefone. O chapéu, que sempre repousava no cabide, sumira como fumaça.

Saiu para a rua com o coração acelerado. As pessoas passavam por ele como sombras. Tentou lembrar o destino, mas a mente era um quarto escuro.

No banco da praça, sentou-se e fechou os olhos. O vento trouxe o cheiro de pão quente. Tentou agarrar a lembrança de uma padaria, mas ela se desfez.

De repente, uma voz suave:

— Papai?

Ele abriu os olhos. Uma moça sorria, os olhos marejados. No colo dela, um chapéu amarrotado. Na mão, uma chave. No bolso do casaco, um celular velho.

— Eu… conheço você? — perguntou ele, trêmulo.

Ela respirou fundo.

— Sim. E amanhã, quando esquecer de novo, eu estarei aqui. —

Joaquim não sabia se chorava pela perda ou pelo amor que, de alguma forma, ainda sentia.

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